Importa-se que ganhe dinheiro?
Não podemos ter pena, vergonha ou medo do nosso interlocutor, seja ele parceiro de negócio ou noiva, há que pôr a razão a comandar a relação e a actividade, de forma justa, sensata e vencedora para os dois lados.
Com a época 2021 a fechar, intuo que é urgente falar de preço, dinheiro e valor.
Certamente que este ano e meio foi feito de entalões financeiros — tentamos cumprir os compromissos que temos (pessoais, bancários, profissionais), recuperar o possível, equilibrar a oferta e a procura (e o que mudou nesta dinâmica), e acomodar tudo e todos, nós incluídos, na grande equação que é a prestação de um serviço ou a venda de um produto.
Nestes tempos mais difíceis há sempre oportunismo: clientes que esmagam o preço de quem está aflito, fornecedores que esmagam o preço porque é fundamental ganhar. É uma zona escura e arriscada da relação e as consequências são sempre mais amplas do que a primeira impressão sugere.
Recuperar de uma oferta de preço baixo é difícil: se retiramos valor a algo, como justificamos o novo preço, novamente mais alto, ao cliente seguinte (ou ao parceiro), quando esse algo é exactamente o mesmo? Não duvidem, tudo se sabe! E ganhar a qualquer custo é o mesmo que perder a longo prazo.
E chegamos à noção de valor: o nosso valor.
O preço que propomos a um cliente, além dos custos fixos inerentes à operação, deve somar o valor do trabalho, do conhecimento, da experiência, do investimento, da qualidade das ideias, da capacidade de execução. Se os primeiros são uma soma de parcelas no Excel, os segundos têm uma imensa margem pessoal e até de auto-estima.
Quanto é que eu valho?
Há quem se sinta o máximo e cobre em consonância, e há quem ache menos de si e o reflicta no número final.
Não é para aí que quero levar esta discussão, até porque o mercado regulará, a seu tempo, o que está over priced.
Aqui, a discussão relevante está do lado dos mais frágeis. Aliás, na lista de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, temos trabalho digno e crescimento económico como factores de peso. Esta dignidade económica, que tanto nos escapa a nível nacional, parece ser um não-assunto quando se fala em crescimento, produtividade e competitividade. Não trabalharíamos melhor, de forma mais motivada, se tivéssemos maior segurança financeira?
Quem contrata quer pagar o mínimo possível, quem compra quer pagar o mínimo possível, e ambos querem sentir-se uns geniais ganhadores. Sempre uns mínimos para uns máximos, o que já é extremo que baste.
Mas eu diria que podemos combater esta arrogância económica, que há espaço para ter voz e mudar a conversa. Dá trabalho, exige estoicismo e uma certa espinha dorsal, mas é fundamental parar de pedir licença para ganhar o valor justo do trabalho de qualidade que se faz.
Não podemos ter pena, vergonha ou medo do nosso interlocutor, seja ele um parceiro de negócio ou um par de noivos, há que pôr a razão a comandar a relação e a actividade, de forma justa, sensata, vencedora para os dois lados. Há que deixar ir um mau cliente (e um mau parceiro), há que dizer um claro “não” ao que não nos dá a tal dignidade económica, há que recusar as más propostas, mesmo sabendo que alguém as irá aceitar. Não nos estão a fazer um favor e não temos que estar gratos por isso, o maior chavão dos últimos tempos!
Façam as vossas contas e façam apostas certeiras. Todos somos elos da cadeia, em pé de igualdade.
Se vos falta a assertividade natural, fake it until you make it e deixem a emoção lá fora. O coração apresenta-se ao serviço num cartão de agradecimento final de um trabalho bestial, ou naquele almoço de celebração, quando fechámos uma boa época, trabalhando com bons parceiros.